Que sentimentos ficam na sua memória? Da infância vêm muitos sabores e aromas, especialmente daquele bolo da casa da avó. Uma música pode te fazer viajar até a adolescência e recordar tantas descobertas. Tem também aquelas emoções que fazem o seu coração bater mais forte, como quando você soltou as mãos do selim da bicicleta e viu sua filha pedalar pela primeira vez ou levou seu filho ao estádio e ele ficou encantado com o barulho da torcida. Isso sem falar nas vezes que se emocionou com uma cena no cinema. Aliás, que saudade de ir ao cinema.
Esse mosaico de emoções forma a alma humana e estabelece um vasto campo de estudo do comportamento dos consumidores. Muito antes de alguém pensar em consumir qualquer coisa ou contratar qualquer serviço, as pessoas colecionam esses momentos, absorvem experiências e compartilham memórias. Ainda que esses sentimentos sejam individuais, todos se sentem ainda melhor em se aproximar das outras pessoas, numa forma empática de convivência.
Eu me lembro de gostar de dar um pulinho ao mercado. Muito de vez em quando, na verdade, mas havia o senso de descoberta de novos produtos, o aroma do pão saindo do forno, as frutas colorindo o espaço, os queijos diferentes e algumas outras especiarias. Tudo isso me chamava a atenção. Naquele momento, não estava tão preocupada com todo o processo. Hoje, isso tem uma carga um pouco mais negativa, por conta de todo o trabalho que dá ir ao supermercado no contexto de pandemia. Antes, essa experiência era um momento de descontração. Hoje, é uma “obrigação”, transformando toda a imagem associada ao espaço.
Nesse contexto, entender as emoções é compreender que, na jornada do cliente, os sentimentos iniciam muito antes da decisão de ir até a sua loja ou comprar um determinado produto. É preciso compreender qual motivação traz o cliente até você e identificar se ele está feliz ao longo de todo o processo. Será que ele encontrou o que procurava e saiu contente com os produtos e serviços? A experiência com a sua marca está atrelada a emoções positivas? O conjunto de algumas emoções ao longo do tempo como: conforto, alegria, segurança, valorização, descontração, tranquilidade, encantamento, nostalgia, realização e admiração formam uma construção sólida de um vínculo duradouro.
Para que isso ocorra, o processo se inicia avaliando as questões que definem a razão do cliente pensar na sua empresa. Quais perguntas o consumidor está fazendo em sua mente e de que forma elas podem se alterar ao longo do caminho? Por que esse consumidor vai até a sua loja? Quais sentimentos estão atrelados a essa necessidade? Como o cliente se sente ao entrar? De que forma é atendido? Onde estão os seus momentos de stress? E de maior realização? O cliente online e off-line é percebido como uma só pessoa? Se você estivesse no lugar do cliente em toda essa jornada, como se sentiria?
Já que falamos de mercados, talvez um gestor tenha que se questionar inclusive como constrói suas referências e encontrará exemplos de negócios que podem parecer simples em um primeiro olhar, mas possuem uma dinâmica muito própria com a comunidade, funcionários, produtores e meio ambiente. Um exemplo interessante é um pequeno mercado regional californiano. Localizado em São Francisco, o Bi-Rite Market é um “case” que vai além de um lugar para fazer compras e pode mudar a sua percepção sobre o setor.
Para eles, cliente é mais que um consumidor. É um hóspede em sua casa.
Essa revolução passa pelo chef Sam Mogannam. Para entendermos essa história, precisamos voltar um pouco no tempo. Fundado em 1940, o lugar foi adquirido 24 anos depois, pelos irmãos Ned e Jack Mogannam. Sam cresceu ajudando seu pai (Ned) e seu tio no mercado todos os dias, depois, seguiu seu próprio caminho como chef e dono de restaurante. O afastamento de Sam não durou muito. Ele se uniu ao irmão Raph e, em junho de 1998, retornou e reinventou o formato do mercado. Trazendo a perspectiva de um chef para o mundo da mercearia, construiu uma cozinha no centro da loja para preparar alimentos e passou a oferecer produtos frescos, diretos da fazenda, preparados na hora e servidos com a hospitalidade de um restaurante.
Em uma nova maneira de se conectar com os consumidores, o Bi-Rite, combinou universos e paixões: comida, pessoas e comunidade, construindo um espaço para a economia local prosperar.
O foco em oferecer produtos de qualidade, trouxe expansão e o mercado abriu o Bi-Rite Creamery em 2006, uma premiada sorveteria orgânica, na sequencia construiu o “18 Reasons”, um espaço físico para os vizinhos se reunirem e encontrarem os produtores. Doze anos depois, uma escola de culinária comunitária que oferece aulas e jantares gratuitos para pessoas de baixa renda.
Analisando os comentários dos clientes nas redes sociais, fica claro que os clientes se sentem muito à vontade. São inúmeros os elogios que destacam o quanto o ambiente é acolhedor, a equipe é experiente e muito prestativa, diversificado mix de alimentos frescos e saborosos. A empresa faz a associação do poder de uma boa comida para conectar pessoas e construir memórias, “Good Food has the power to create memories, connecting us to a moment and to each other” , desta forma as diferentes necessidades de consumo se transformam em novas experiências. Precisa preparar um jantar? Um time de chefs criativos está à disposição. Vai mandar uma cesta de frutas para a sua mãe? Eles montam e entregam. A cada momento de interação, o cliente encontrará atenção, recomendações e boas opções de escolhas. O formato de sucesso se repete no ambiente digital, o cliente se sente tão bem atendido online quanto quem comparece à loja física.
O comprometimento em construir uma comunidade através da comida, unindo paixão, propósito, processos, pessoas e prontidão, permite a construção de um vínculo sólido baseado em confiança, que impulsiona diariamente a tomada de decisão.
A empresa, então, pode transcender a sua missão e construir uma “Identidade de Experiência”.
Assim, participa ativamente da jornada de emoções que ocorre antes, durante ou após o período que o cliente esteve na loja. Com isso, a empresa se torna capaz de avaliar quais emoções espera causar em toda a sua cadeia.
Sentir-se bem acolhido é uma grande vitória para o dia a dia do cliente. E ainda mais para a companhia que realizou o processo corretamente. A marca saberá que conquistou o seu troféu, quando passar a ser defendida de forma espontânea pelo público, até porque fãs são conquistados pela emoção e trazem na memória quando uma empresa faz diferença em sua vida.
Andreia Mariano
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